A psicanálise é um método de investigação e tratamento pensado e desenvolvido por Freud no final do século XIX. Durante os últimos 120 anos, vários profissionais das áreas de saúde e ciências humanas deram continuidade à pesquisa e estudos do psiquismo, mantendo a psicanálise atualizada e cada vez mais em consonância com o contexto social e cultural.
Assim, como exemplo, podemos lembrar que na época de Freud a histeria de conversão era um sofrimento comum. Pacientes (em sua maioria mulheres) apresentavam sintomas como cegueira ou paralisia de membros sem que fossem diagnosticados quaisquer problemas neurológicos que justificassem o quadro clínico. Estes sintomas estavam relacionados com experiências emocionais e desapareciam com a técnica que vinha sendo desenvolvida por Freud de fazer as pacientes falarem e associarem seu sofrimento físico com o trauma psicológico.
Hoje, os sintomas mais presentes nos consultórios de psicologia são outros. Depressões, ansiedades, insônias, uso abusivo de drogas, transtornos alimentares, compulsões diversas, estão entre as queixas mais comuns. Isso nos fala sobre nossos tempos; são sinais de como o psiquismo vem reagindo ao modo de viver. Os quadros chamados “limites” ou “borderlines” também nos interrogam sobre como estamos conduzindo nossas vidas no mundo contemporâneo.
Um dos aspectos relacionados com a sociedade atual é a aceleração. Não se pode dormir; é preciso produzir todo o tempo e acertar sempre. Isso tem efeitos no psiquismo. Outro fator é o forte investimento midiático na imagem e no corpo, o que pode desencadear sentimento de rejeição, desvalorização e angustia.
Os sintomas psicossomáticos também tem se apresentado de forma relevante na clínica. Não há dúvidas sobre a relação entre mente e corpo. Os estudos da psicanálise nos ajudam na compreensão e no tratamento das doenças psicossomáticas. É fundamentalmente porque a mente não dá conta de trabalhar com tamanha quantidade de energia psíquica que o “excesso” transborda para o corpo que padece porque os recursos internos não estão conseguindo dar um destino mais saudável para os conflitos.
Por isso entendemos que a subjetividade se dá em um contexto sociocultural, ou seja, o material psíquico é constituído dessas duas características: a singularidade (história pessoal) e o contexto em que vivemos.
Freud descreveu, com profundidade, todo o funcionamento psíquico e desenvolveu uma técnica que possibilitou a expressão e a elaboração dos conflitos e sofrimentos dos (as) pacientes. Os tempos mudaram, os sintomas mudaram, mas as leis que determinam como funciona a dinâmica psíquica permanecem as mesmas. Situação que dificilmente pode ser questionada, tanto por quem exerce a psicanálise quanto por quem atravessa uma experiência analítica e pode usufruir de seus benefícios.
Acreditamos que apenas tentar eliminar o sintoma não resolve o sofrimento da pessoa. Até porque, muitas vezes, o sintoma se desloca: alguém que tenta resolver a compulsão alimentar com uma cirurgia bariátrica, mas não trabalha as causas desta compulsão, pode vir a deslocar este sintoma, substituindo uma compulsão por outra, por exemplo.
A psicanálise entende que muitas das causas e origens dessas problemáticas são desconhecidas, pois estão encobertas por mecanismos de defesa que as pessoas desenvolvem para se manter em relação com seu campo social (família, amizades, trabalho, estudos entre outros). Este é um dos objetivos do trabalho psicanalítico: buscar descobrir, entender e, se necessário, transformar tais mecanismos.
Por isso, psicanalistas devem ter uma escuta aberta para o material que surge nas sessões, ajudando a traduzir seus desconhecidos e estranhezas em impulso para a vida. O processo não é breve, mas, diferentemente do que se acredita, as pessoas sentem os efeitos benéficos da análise logo nos primeiros tempos. Ninguém permaneceria em um tratamento se não fosse assim.
A psicanálise não promete a felicidade, mas oferece a possibilidade de realizar uma experiência única de autoconhecimento, de se haver com seus desejos para que possa dar um destino mais criativo aos conflitos, que não seja pelos sintomas.
A psicanálise é uma psicoterapia?
A psicanálise surge na mesma época dos primeiros estudos sobre psicologia e foi fundada por Sigmund Freud, um médico neurologista austríaco interessado nos fenômenos psíquicos muito intrigantes para a sua época, as chamadas neuroses histéricas. A partir desses estudos, Freud compreendeu a existência do inconsciente psíquico, que estaria na base da formação dos sofrimentos neuróticos. Desde então, a psicanálise se desenvolveu e avançou na compreensão do psiquismo humano, constituindo uma teoria em constante aprimoramento; um método de investigação e produção de conhecimento científico, além de uma abordagem clínica para tratamento das diversas formas de sofrimento mental.
Como abordagem clínica a Psicanálise pode ser considerada uma forma de psicoterapia, pois se caracteriza pela “cura pela palavra”. Isso quer dizer que o processo terapêutico se desenvolve a partir da fala da pessoa sobre as questões que a afligem e é isso que organiza e dirige o tratamento. Por outro lado, a Psicanálise diferencia-se das psicoterapias porque dá ênfase às causas que levam à formação do sintoma, valorizando a singularidade de cada pessoa, sem propor explicações genéricas e padronizadas. A psicanálise compreende que os sintomas revelam aspectos que são de difícil superação e têm relação profunda com conteúdos que foram suprimidos da consciência, mas ainda causam mal-estar. Assim, para a psicanálise, interessa questionar o sentido dos sintomas, compreendendo que a elaboração dos conflitos que lhes deram origem permitirá um reposicionamento da pessoa frente àquilo que provoca sofrimento.
Por que escolher psicanálise?
Em 1930, Freud escreveu um livro muito impactante chamado “Mal-estar na civilização”, no qual afirmava que as relações com outros seres humanos são fonte permanente de sofrimento e mal-estar. Se por um lado ninguém consegue viver sozinho, tampouco as relações interpessoais asseguram prazer e felicidade.
Recorrendo a uma metáfora de Schopenhauer, ele comparava essa condição a de um grupo de porcos-espinhos durante um rigoroso inverno: buscando refugiar-se do frio intenso, eles se aproximavam para aquecerem-se mutuamente, entretanto, com a proximidade, os espinhos causavam ferimento e, então, eles se afastavam. A distância os deixava indefesos ao frio e fazia com que novamente se aproximassem, num interminável ciclo de aproximação e distanciamento.
Os dias de hoje são particularmente turbulentos, tendo em vista a sobrecarga de compromissos, de cobranças e a urgência incessante de tudo. Os desafios do trabalho, as exigências de desempenho e de atender expectativas provocam desgaste e sofrimento. Nesse contexto tão adverso, os relacionamentos e as possibilidades de encontros gratificantes ficam muito comprometidos. Todos esses aspectos podem gerar tristeza, e outras formas de adoecimento. Ainda lembrando o texto freudiano, a condição de existência humana não promete felicidade plena, que soa ingênua e descolada da realidade. Por isso, a psicanálise aposta nas condições únicas que cada pessoa tem, de enfrentar seus conflitos e desconstruir fantasias e ideais irrealizáveis. Por sua vez, as/os psicanalistas, ao se colocarem ao lado das(os) pacientes, podem contribuir para que ressignifiquem as experiências dolorosas e se fortaleçam para enfrentar outros desafios da vida.
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